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Ritual de domingo

Natália aguiar

Durante grande parte da minha infância, frequentei os jogos do Sport semanalmente com vovô Nando, meu avô materno. Por ser a neta mais velha, acho que ele viu em mim uma oportunidade de compartilhar o amor pelo time e pelo futebol, que nunca conseguiu passar aos filhos. E, assim, fez-se uma rotina que me encantava. Todos os domingos, por volta das 14h, meu avô buzinava no portão. Descia correndo e entrava no carro o mais rápido que podia, para não perder um minuto daquele nosso ritual. Na chegada ao estádio, meu avô comprava pipoca para mim e uma cerveja para ele, conversávamos sobre nossa semana até a hora do jogo, e depois daquelas duas horas, que eu, sinceramente, não entendia nada mais do que a bola na rede, íamos embora, parando para comer uma pizza, quando o Sport ganhava, ou um espetinho, quando perdia. 

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Esses foram os meus domingos por 7 anos. Perto do meu aniversário de 15 anos, meu avô sofreu um infarto fulminante e eu o perdi. Desde então, nunca mais senti que ir ao estádio teria a mesma graça. Continuei acompanhando meu time pela televisão, mas aquela sensação de saber que ver o jogo ao vivo é infinitamente melhor nunca mais me atentou. E foi assim durante vários anos. Não que ficasse triste a cada jogo sem ele, nem que torcer deixava de ser algo que me agradava, mas sentia que ter aquele ritual sem meu avô seria quase como traí-lo.

Hoje tenho 29 anos, e um filho pequeno de 6 que, como a maior parte dos meninos da sua idade, é louco por futebol. Sempre deixei ele livre para praticar o esporte que quisesse, mas o futebol e o futsal sempre foram as atividades que faziam seus olhos brilharem. Mesmo com sua pouca idade, fazia questão de assistir comigo os jogos na TV da sala e comentar todos os dribles e passes com total propriedade.

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De uns tempos para cá, meu filho me pede para irmos a um jogo no estádio, sempre acabo inventando uma desculpa: a insegurança, a lotação, não tem replay, em casa é mais confortável e por aí em diante. Semana passada completou-se 15 anos da morte do meu avô e, num impulso, decidi comprar os ingressos para assistir ao jogo do Sport na Ilha do Retiro. Meu filho quase não conteve a ansiedade pelos poucos dias que se passaram até o domingo, e eu não sabia o que esperar daquele dia.

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Quando o domingo chegou, confesso que pensei em desistir, mas ver a animação do meu filho para aquele momento me impediu. Chegar ao estádio, ouvir o pagode tocando perto da piscina, subir os degraus que davam nas sociais e ver a ilha lotada me trouxeram emoções que nunca achei que sentiria de novo e que jamais serei capaz de descrever.

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Naquele domingo, gritei, junto com meu filho, todos os hinos que nunca esqueci, reclamei das faltas não marcadas e vibrei, como nunca, cada gol marcado. Nandinho me disse que foi um dos melhores dias da vida dele, naquele momento sabia que meu avô estava ali comigo. Saímos do jogo e fomos comer uma pizza, como manda o ritual.

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