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Meu pai, ketchup e Juninho Pernambucano

MARIA EDUARDA FRANÇA

O ano em que nasci, 1998, foi o mais feliz de todos para meu pai, porque o Vasco foi campeão da Libertadores graças ao gol de Juninho Pernambucano contra o River Plate no Monumental e, segundo ele, meu nascimento foi o motivo disso acontecer. Com isso, virei o amuleto de sorte e até os cinco anos tinha toalha, boné e todos os apetrechos do time mas sentia ciúme desse amor infinito do meu pai por um time. 

Competia pelo amor roubado pelo Vasco como os próprios jogadores roubavam a bola mas nada funcionava e, com ele definitivamente só ia brincar comigo quando acabasse o jogo, decidi me unir ao inimigo. Comecei a olhar para aquele campo verde, com vários jogadores e narrações que nada entendia, e meu pai começou a me explicar cada detalhe, inclusive sobre as camisas de todos os times e as histórias de todos os jogadores e o celestial São Januário que estava a quilômetros e quilômetros de distância, já que na época morávamos no Piauí.

Com o tempo, minha paixão foi crescendo e eu arranjava briga na escola, não comia nada com ketchup porque era da cor do Flamengo e muito menos poderia me apaixonar por alguém que torcia para esse time feio! Meu pai se enchia de orgulho e, finalmente, sentia que tinha empatado essa partida com o Vasco e saímos de mãos dadas e grande irmãos dessa emocionante jornada. Nas férias de 2011, eu e meu pai estávamos na nuvem de tanta felicidade, viajamos para casa da minha vó no Rio de Janeiro e, durante a preparação da viagem, meu pai já se emocionava só com a ideia de eu finalmente conhecer o estádio do Vasco. 

Primeiro fomos visitar o estádio, é uma das memórias mais vívidas que tenho. Lembro do gosto do purê de batata que comi no self service que tinha lá dentro, da sala dos troféus, que eram enormes e muitos. Estava finalmente em casa, com aquela construção arquitetônica cheia de desenhos marítimos na parede, imenso! Um verdadeiro palácio. Lá eu dei meu jeito de pisar no gramado do estádio e dar uma mini caminhada antes dos seguranças me avistarem. Meu pai, você já pode imaginar, não parou de chorar de emoção porque a filha dele pisou onde seus grandes ídolos pisaram. 

Ainda na mesma viagem, tivemos a sorte de poder assistir à volta de Juninho Pernambucano ao Vasco. Quando chegamos, vi todo aquele alvoroço e todas aquelas pessoas vestidas que nem eu, no grande caldeirão. Comecei a cantar com todo mundo e abraçar bem forte meu pai. Foi uma emoção sem igual! Fernandinha Abreu fazia a apresentação chiando que nem água fervendo, e todo mundo atento vendo juninho segurando a mão de seus filhos e de sua esposa saírem do famoso túnel, que eu sempre só via pela televisão. Estava impressionada com a diferença que era assistir toda aquela movimentação no campo ali da arquibancada pertinho de todo mundo, vendo o verde do gramado que por algum motivo, eu tinha certeza que era bem mais verde na televisão. Ali conseguia sentir toda a emoção que os narradores confusos tentavam passar. Ouvia fogos e muita cantoria “Contra o River Plate sensacional, gol de quem? Gol do Juninho, monumental!” e não conseguia parar de sorrir. Realmente estava lá dentro vivendo tudo aquilo, dessa vez  não estava só ouvindo histórias. Procurei meu pai e ele não estava mais do meu lado, tinha ido comprar cachorro quente. Trouxe animado, mas esqueceu de tirar o ketchup. Ofereceu pra mim e eu neguei automaticamente, ele perguntou se eu tinha certeza e eu ri contando meu argumento que eu repetia desde pequena. Meu pai disse gritando, já que era quase impossível conversar naquela festa toda, que estava tudo bem porque o vermelho do ketchup era da nossa mais linda Cruz de Malta.

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