De troféus a campeãs: o início da evolução da participação feminina nos esportes
Como o acesso das mulheres aos Jogos Olímpicos na Grécia Antiga explica historicamente o papel da mulher política e social na época.
reportagem: barbara gabriele
edição: gabriela castello buarque
Quando vemos grandes atletas como Simone Biles, que aos 22 anos superou qualquer outro atleta da história, conquistando a 25ª medalha em mundiais, ultrapassando o marco de 23 do ginasta bielorrusso Vitaly Scherbo, a primeira coisa que vem a nossa cabeça é o quanto ela deve ter se preparado para ser tão forte e chegar onde chegou.
Mas, nem sempre foi assim. Por muitos anos as mulheres eram literalmente troféus para os homens que venciam a competição de corrida de biga. De acordo com a professora e pesquisadora da Universidade Gama Filho (RJ), Ana Miragaya, as mulheres não podiam participar de atividades desportivas, pois acreditava-se que o corpo feminino era feito única e exclusivamente para a gestação.
No ano de 776 a.C, um evento religioso que de quatro em quatro anos unia competidores para adorar e honrar seus deuses através de jogos e lutas foi iniciado. O evento era chamado de Panatéia.
Nesse período, as mulheres casadas eram proibidas de ter acesso à vida pública e econômica. Assim, consequentemente aos Jogos Olímpicos, o acesso da mulher a essas práticas era considerado algo tão grave que, caso acontecesse, ela estaria sob pena de morte. No entanto, quando se tratava de mulheres solteiras, era permitido um lugar na plateia. Os Jogos eram vistos pela sociedade como uma forma de avaliar os “atributos físicos” dos homens, ou seja, as solteiras eram permitidas apenas no pretexto submisso ao homem, para encontrar um marido.
O motivo? Mais uma vez a crença masculina e religiosa de que os corpos femininos eram para reprodução. Esses jogos eram sediados em stadiuns localizados em regiões montanhosas, e como o corpo feminino era considerado frágil, o acesso a esses locais poderiam ser prejudiciais, acarretando danos fisiológicos.
As únicas com o acesso autorizado eram as sacerdotisas. Como elas eram reverenciadas por todo o povo, e consideradas mensageiras dos deuses, a participação delas era não só permitida como também solicitada, já que acreditava-se que a presença de sacerdotisas trazia boa sorte aos participantes. Além disso, as coroas de oliveira, o símbolo da vitória dos jogos, eram entregues aos vencedores por elas.
Arte em vaso antigo ilustrando Sacerdotisa entregando coroa de oliveiras ao vencedor dos jogos / Artista desconhecido / ano desconhecido
A intolerância quanto a participação feminina nos jogos olímpicos durou até o século 6 a.C, quando, após o grande sucesso consolidado das Olimpíadas da Antiguidade, foi criado os Jogos Heranos, em honra à deusa grega Hera, uma versão feminina dos jogos masculinos.
Assim, exatamente como nos eventos atléticos masculinos, as Heraias consistiam basicamente em esportes de corrida e de campo. Porém, as suas posições políticas e sociais mantinham-se acesas, pelo fato de que uma das regras mais importantes para participar dos jogos era vestir-se como homem. No entanto, os homens não podiam assistir às competições, isso porque uma crença antiga dizia que se um homem observasse uma mulher desempenhando atividades atléticas, elas perderiam o valor para seus pretendentes.
Pintura antiga em vaso grego, ilustrando competição de corrida das mulheres nas Heraias / Artista desconhecido
A participação de mulheres e homens no mesmo evento esportivo só aconteceu em 1900, na Olimpíadas sediadas em Paris, na França. Na ocasião, 997 homens participaram do evento, contra 22 mulheres.