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Bicicletas garantem transporte eficiente e vida mais saudável

Ascensão do meio de transporte alternativo e mais democrático inspira um novo estilo de vida nos grandes centros urbanos 

reportagem: isabela aguiar

edição: letícia sarinho

Viver em uma cidade como Recife é um verdadeiro misto de paixão e sufoco. Se por um lado o visual deslumbra quem passa pelo Marco Zero no fim da tarde de um domingo, por outro, apavora qualquer um preso no trânsito quilométrico da avenida Agamenon Magalhães, no horário de pico durante a semana. É por esse motivo que, em busca de agilidade e economia na locomoção, um número cada vez maior de pessoas tem optado por investir em bicicletas, ou até mesmo no aluguel delas, para cumprirem seus deveres cotidianos.

Adquirir um carro nunca foi uma opção para Juliana de Carvalho, estudante do curso de História na Universidade Católica de Pernambuco, que calcula as despesas muito além do preço da compra, incluindo os gastos gerados pelos encargos, gasolina e manutenção. Para a ciclista, também é impensável depender exclusivamente do transporte público para chegar aos destinos, por causa do tempo de espera e do elevado preço das passagens, que sofrem constantes reajustes. “O desafio de estar de bike nas ruas são mais os carros, os motoristas que não respeitam e não têm nenhuma empatia por quem tá ali”, denuncia. 

A escolha da bicicleta como alternativa de locomoção foi feita por Juliana há seis anos, quando percebeu ser muito impaciente para enfrentar o trânsito do Recife. “Além de encurtar minhas distâncias e reduzir deslocamentos, ir de bike me proporciona bem-estar grande por conta do exercício e do vento no rosto”, afirma, garantindo cumprir, sem atrasos, todos os compromissos que se propõe quando resolve pedalar. “Essa sensação de bem-estar para o meu corpo, carro nenhum proporcionaria”, conclui, e logo depois se declara: “Minha relação com a bicicleta é de apego, afeto, dependência”. 

Segundo os dados coletados pelo aplicativo de transporte urbano 99, entre os meses de junho e agosto de 2017, Recife ostenta o título de cidade brasileira com o pior tráfego, seguida por Porto Alegre e Belém. Na capital, viagens na hora do rush demoram, em média, de 81% a 102% a mais de tempo do que as iniciadas em situação de tráfego livre. Isso quer dizer que as pessoas que utilizam meios convencionais de transporte perdem muito mais tempo em deslocamentos comuns para cumprirem compromissos semanais, comprometendo a qualidade de vida com rotinas ainda mais cansativas.  

Não é à toa que empresas como a Bike PE, sistema de compartilhamento de bicicletas públicas, introduzido na cidade em 2013,  consolidou-se em solo recifense. Segundo dados do próprio sistema, os maiores picos de uso são em dias úteis, das 8h às 9h e das 17h às 19h, com tempo de deslocamento estimado em 22 minutos durante a semana, o que comprova o uso da bicicleta como meio de transporte. O número de viagens saltou de seis mil para 110 mil viagens/mês esse ano mas, mesmo com a crescente demanda, o Bike PE segue com a mesma quantidade de pontos de bicicleta desde o início, suprimindo a necessidade de expansão. 

 

A prática do ciclismo como lazer já ultrapassa os dias de passeio na ciclofaixa exclusiva para bikes, proposta pela prefeitura, aos domingos e feriados nacionais, e que ligam bairros da Zona Norte, Sul e Oeste da cidade em um trecho de mais de trinta quilômetros. Em Casa Forte, um grupo de amigos chama a atenção de quem passa às quartas-feiras, depois das 19h, pela quadra da Vila Vintém, embaixo do viaduto do Carrefour. O Recife Bici Polo realiza partidas semanais de um irreverente esporte, a reinterpretação recifense do tradicional jogo britânico polo, onde a performance originalmente desempenhada em cima de cavalos é substituída pela desenvoltura dos participantes em bicicletas. As regras basicamente são as mesmas: três ciclistas de cada lado da quadra, conduzindo uma bolinha de plástico ou de madeira até o gol adversário, com o auxílio de um longo taco. 

Para Breno Galvão, um dos organizadores e praticantes de bike polo, utilizar a bicicleta também é algo cotidiano, que extrapola os limites que caracterizam a atividade como lazer. Ele é ciclo entregador e faz parte da nova realidade empregatícia do país, a chamada “uberização do trabalho”; modelo informal marcado pela flexibilidade de condições de trabalho introduzida no Brasil pelo aplicativo de transporte Uber.

O índice atual de desemprego no país tem cada vez mais empurrado pessoas para a busca de trabalhos alternativos, que garantam alguma forma de sustento ou complemento de renda, como é o caso do serviço prestado por pessoas que fazem entregas de bicicleta. Os desafios, além da precarização do trabalho, também têm relação com a violência urbana gerada pelo tráfego intenso e fatores como o aumento do número de acidentes envolvendo ciclistas em Pernambuco. “O motorista tem que saber que tem que estar atento à bicicleta, porque ele tá transitando em um veículo que pesa uma tonelada, enquanto a gente tá muito mais vulnerável ali do lado deles”, salienta Breno.

Levantamento feito pela Secretaria Estadual de Saúde (SES) registrou nos hospitais um aumento de 80% no atendimento a ciclistas, nos últimos três anos. Embora a prefeitura garanta que há novos projetos para a expansão da malha cicloviária, o suporte ainda é muito limitado, estimado pela CTTU em apenas 70km de ciclofaixa em Recife, o que também dificulta a vida de quem escolhe se aventurar pela cidade de bicicleta.

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